quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Eu quero ir embora...

Arrumando uma mala de roupa ela não sabia pra onde ir, na verdade nem se dava conta de que tipo de roupa enchia a mala.
-" Eu quero ir embora, eu quero ir embora!  "
Repetia essa frase em voz baixa para si mesma diversas vezes.
Só não sabia ela para onde ir ... a mala já estava pronta.
Uma corrida até a cozinha para olhar o relógio, viu os números e os ponteiros, que não lhe indicavam nada, estava perdida demais para processar tal informação. Já agoniada com o pensamento de fugir, ir embora teve um súbito cansaço, a gravidade a puxou e ela se sentou no chão do quarto.
Um, talvez dois segundos foram necessários para ela ser transportada para os labirintos de sua própria mente, para o céu e o inferno de seus pensamentos.
Se viu nua, fazendo amor com o amor de sua vida, podia sentir o cheiro do momento, era uma espectadora de sua própria vida, suas ações ... da cena de amor pulou para seu passado, sentiu um peso enorme sobre os ombros, se viu caindo na infância, se viu em descobertas na adolecência, se viu errando muito, muito choro, muitas risadas, se viu recebendo o diploma, viu uma briga com os pais, se viu julgando muito as outras pessoas, e se viu sendo loucamente julgada também.
Outro pulo e lá estava ela, nas dúvidas, nos medos e em vértices muito intímos de seu caráter e personalidade, assustou-se, não quis ficar muito ali, sentiu poder, e ela sabe que poder é perigoso. Pulou novamente, caiu em um lugar que não reconheceu, um lugar vazio, grande e vazio, resolveu descobrir que lugar era aquele, sentiu até um frio na barriga e decidiu ir em frente.
Andou perdida no começo, andou em círculos, parou, virou, voltou, não havia norte, nem sul, mas não parou de andar. Sentindo-se confusa se perguntou como poderia ter esquecido tão grande momento em sua vida, o que era aquele buraco negro em sua mente, respirou fundo, agachou-se e viu no chão linhas quase imperceptíveis, forçou mais ainda os olhos e viu datas acima das linhas, datas que ainda não haviam chegado, datas que ainda não viveu.
Entendeu que ali não era lugar pra ficar, percebeu que não havia nada pra ver, percebeu também que pelo espaço vago que encontrou ainda lhe restava muito o que fazer.
Um novo salto, caiu em seu quarto, uma atmosfera pesada, triste e fria, assustou-se quando se viu passar correndo com roupas agarrada ao corpo e enchendo freneticamente uma mala. Parou de frente a cena e sentiu pena e compaixão por si mesma. Enquanto tentava fazer uma conexão com o que estava vendo e o que sentia assistindo a cena ouviu-se repetir a frase - "Eu quero ir embora, eu quero ir embora..."
Chocada com seu desespero, aturdida com o que vira, suspirou fundo, sentou no chão como se seu peso fosse incapaz de sustentar, entre um questionamento e outro entendeu, - " Estava tentando fugir de mim mesma, queria ir embora da minha vida, não morrer, somente fugir de mim..."
Percebeu que aquilo não era possível, percebeu o quão fraca foi, fechando os olhos lembrou-se do que viu em sua mente, seu passado, suas realidades, suas características de personalidade e sentiu vergonha de se ver tão desesperada, uma careta de insatisfação surgiu em seu rosto ... outro suspiro e outro choque, em segundos acordou, estava deitada no chão do seu quarto.
O rosto e a manga do moleton molhadas de lágrimas, - "Isso não foi um sonho..." , resmungou ainda tonta, levantou e viu em cima da cama uma mala cheia, fechada, viu seu cachorro a olhando, até ele questionava a situação...
Com todo pensamento somado em sua cabeça, com muita dúvida sobre o que acabara de acontecer, quase que sem entender nada, ela pegou o cachorro, um cigarro e foi para o jardim, pensou - " Também não posso fumar, mas é melhor que desistir e ir embora ..."

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